Pedrinho e a lenda da Avoante
Pedrinho é um menino muito sabido Mora no sertão do nordeste brasileiro Sua casa é feita de barro bem batido Coberta com as folhas de açaizeiro
Entre as brincadeiras de atiradeira E de mergulhar os pés no igarapé Em tempo de inverno na saideira Festejando o milagre de São José
Com as mãos dadas da roda formada Na cantilena repetida sempre em versos Pedrinho escutava da história contada Pelos mais velhos salvos do adverso
Nos tempos de seca brava e sem fim Diziam da espera da amiga avoante Que em nuvens de bando do assim Formado cardume visto distante
Trazia fartura de carne da arribação Com arroz e feijão sobras da semente Em solo seco secando sem ter chão No riso pálido amarelo e doente
Colhendo do céu o presente ofertado Em troca da reza feita nos dias de estio O suor quente feito pelo tronco arqueado No peso de mil avoantes dentro do balaio
Enchia os olhos de água salgando a fome Sem levar ao mercado da despensa vazia Dividindo como vizinho sem ter nome Escrito no registro da tal de ecologia
Pedrinho a tudo prestava muita atenção Na escola da vila era o último da fila Na merenda minguada vinda do casarão Não fazia fita comia o gosto da argila
Moldando na mente a lição do dia a dia Na partida do irmão maior para o sustento Embornal cheio de sonhos na garantia Do regresso farto levado a muito tento
Na cidade grande a saudade traz em roda Da carne salgada repartir como iguaria Ao paladar refinado do patrão no nada Em volta na volta da avoante em garantia
Pedrinho deixa cair da atiradeira sem mira Plantando tristeza a pedra fica no chão Como marco da avoante feita tira a tira Enfeitando da mesa posta lá no casarão
Em mãos alheias da vida junto da natureza Morta em quadro pintando lá do agreste A miséria devaneada em lei da sutileza Oculta no estudo da ecologia feito teste
Sem fazer de apologia na defesa inglória Das noites frias e dos dias quentes de calor Restam da arribação apenas fotografias Do respeito ao ter quando se sabe dispor
No sábio caboclo sem contato da civilidade Esquecida da simples troca sem comércio Parido na ambição do hoje em paridade Do amanhã traído por quem se diz sócio
Resta ao nosso Pedrinho contar em conto Da lenda prevista em linhas vermelhas No verde da filosofia nascida do ponto Dito certo e criado em cobertura de palhas
Compactuando de histórias ao pé do fogo Em gravetos secos de fracas lembranças Do vôo tampando do sol os olhos cegos De um povo sofrido na vida esperança
É tarde Pedrinho do casarão vieram redes Deixando na areia quente mortos nascituros Triste sina da repetição presa na parede Sem cal ou sal para garantir do futuro
Esconda a lágrima que vem chegando Deixe das mãos em prece uma oração Nascer do par de pombas em bando O início do protesto feito única ação
Tocando em grades feitas para exposição Olhos brilhando sem vida no vidro moldado Penas apenas penas no peito sem coração Sobras de um vôo que ficou embalsamado.
Ramoore
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