O Bobó da
Benedita
Depois de um final de semana prolongado,
sinto na pele o ardor provocado pelo sol,
sinto nos olhos a areia do falso mergulho,
sinto na boca seca da estrada em serpentina...
Resolvo dar uma parada para aliviar
das dores, da ardência e do incômodo
da viagem de volta ao mundo emprestado,
onde, entre fumaça e mal humor, sobrevivo...
Foi quando ouvi o moleque gritar;
- Olha o camarão fresco!
Senti na pele queimada, a ofensa repetida,
em alto e bom som, o moleque apregoava:
- Olha o camarão fresco!
Quando já ia mostrar o sinal de macho,
o moleque disse sem cerimônia:
- E aí, freguesia, vai levar camarão?
Fiz ares de doutor no pescado,
cheirei e senti a textura do camarão:
- É, está fresco!
- Até parece que estão vivos!
O moleque vivaldino como só,
foi logo valorizando do pescado:
- Em toda a praia, não existe melhor!
Pensei no Bobó da Benedita, e comprei.
Já mais aliviado, voltei para estrada
acelerando o desejo de chegar em casa,
fui lembrando dos ingredientes:
- Camarão limpo e descascado (um quilo)
- Cheiro verde e coentro (meio maço)
- Tomate (quatro) cebola (uma grande)
- Azeite de dendê, eu prefiro o azeite de oliva
- Limão (um inteiro de bom tamanho)
- Mandioca, dois quilos mais, ou menos
- Sal e pimenta (a gosto)
Pensando na mandioca, lembrei da feira
e da Benedita sorrindo ao dizer:
- Mandioca igual a do Zécão não tem!
- Pode procurar em todas as barracas!
- Eu garanto que não vai encontrar!
Entrei em casa tirando tudo, toalhas, chinelos,
roupa suja, esteira e areia deixada no tapete,
Depois de um bom banho,
e de untar o corpo em creme hidrante,
ouvi da cozinha a bendita Benedita:
-Fui na feira, comprei quase tudo.
- Procurei camarão para fazer um Bobó.
- Mas, não tinha camarão fresco!
Com as mãos escondidas, entrei na cozinha,
A bendita Benedita fez cara de riso, e disfarçando:
- Nossa! Como você está vermelho!
Fiz de conta que não entendi a piada,
e sem dar tempo para mais uma gozação,
mostrei os camarões fresco e vermelhos...
A bendita Benedita, pegou e examinou,
um a um os camarões foi limpando
e colocando na tigela com sal, alho e limão,
enquanto falava da mandioca do Zécão...
Eu meio sem jeito me ofereci
para descascar e colocar para cozinhar...
Fiquei admirando a forma de cortar
bem fininho o cheiro verde,
o coentro e a cebola e os tomates,
lembrei da panela de pedra e do gostinho especial,
infelizmente, um dia da geladeira direto ao fogão,
a panela trincou e agora guardava farinha...
Depois de cortar todo o tempero, bem fininhos
A bendita Benedita, juntou ao camarão limpo
e deixou apurar por uma hora para dar gosto,
Colocou o azeite na panela para aquecer bem
no ponto certo foi colocando o camarão, deixou fritar
e acrescentou o resto do caldo de tempero,
abafando a panela até o camarão ficar cozido.
E chegou a hora de pegar a mandioca do Zécão,
já cozida e pronta para bater no liquidificador.
Aproveitando da água usada no cozimento,
e cortando em pequenos pedaços,
a mandioca do Zécão virou um mingau...
Na panela do camarão, deixada em fogo baixo,
a bendita Benedita, aumentou do fogo
e com muito cuidado foi colocando
o mingau da mandioca e mexendo
as cadeiras e a colher de pau
com muito jeito foi dando o ponto do Bobó,
colocando mais um pouco de água quente.
Na mesa arranjada com toalha de linho, talheres,
pratos e travessas, sem esquecer
do arroz branquinho e solto.
O Bobó colocado na tigela com tampa,
cheirava desejos de fartura...
Foi quando a Benedita, falou:
-Tudo pronto, meu rei, só faltam os convidados!
- Eu preciso me apressar, o Zécão vai me pegar!
Eu, fazendo cara de inocente, respondi:
-Para que a pressa, você não sabe dos convidados!
- Hoje, é um dia especial!
- Atenda a porta, tire o avental e vamos festejar!
Abrindo a porta, a bendita Benedita
despachou o florista e deixou o Zécão
entrar em seus olhos e sorrisos de dar água na boca.
Era o aniversário da Benedita, o resto foi a louça para eu lavar!
Ramoore